Páginas

3 de janeiro de 2008

Diálogo Final

- Então é isso?

- Explico o que vejo apenas uma vez, depois, se tentar explicar de novo, vai sair outra coisa diferente. – disse ela.

- Então você acha que tudo é possível?

Ela riu. Possível era uma palavra muito forte, e não bastava para ela apenas contemplar essa pequena e poderosa junção de letras. Não ousou dizer que não encontrava nas coisas impossíveis alguma possibilidade de existência. Para ela era como se todas as coisas já tivessem sido inventadas.

- Ué, as coisas não poderiam ter saído de um jeito diferente!

Teria então que inventar palavras novas para poder explicar as coisas que ainda germinavam e que, algum dia, explodiriam em milhões de pedaços de sentimentos inéditos. E aí todos diriam: “Veja se você não termina como ela, ela não ama, ela não é amada!”

Indecifrável e poderosa, e nenhuma dessas duas coisas também na maioria das vezes. Ela era feita das partes do mundo que menos entendia. Depois com o silêncio, colocaria sua cabeça no ombro dele, e como se tentasse explicar que se sentia feliz, afundaria seu rosto e o abraçaria com um abraço longo. E ele permaneceria imóvel, tentando explicar-se o que era aquele misto de sentimentos que o tocava quando tinha a presença dela. Não sabia se eram verdadeiramente bons, mas pelo menos não os sentia ruins. E enquanto pudesse agüentar, o seu silêncio serviria de consolo. Sorriu, mas um sorriso que só ele percebera, e quando fez um leve gesto com as mãos à procura de qualquer pedaço de pele dela, seu rosto surgiu do ombro e seus olhos estavam aguardando ansiosamente os dele. Abaixou as mãos, e despertou de seu leve sono que ela o fazia sentir.

- Então... – ele disse.

“Não, meu querido, não vá! Eu sei, sei que te deixo entediada, mas calma, calma, não me entender... O mesmo eu sinto quando estou com você. Como poderíamos então, confiar um no outro? Sim, já nos calamos demais com tanta presença, e ainda não nos entendemos meu bem. E você aí, tão perto de mim, mas ao mesmo tempo tão longe. E depois... e depois? Não mais te tocar, te falar... Será que só depois disso nos entenderíamos? Não sei...”

- Sim.

“Por que você insiste em ser estranha? Por que ao menos uma vez não me conta algo real, tangível. Quero poder te tocar, mas você não deixa. Esse seu sorriso, suas palavras e gestos loucos me fazem te sentir menos ainda. Vai, fala comigo, de verdade, quero te conhecer, saber de você, como você levanta, sua cor favorita, sua comida, seu cheiro... você... é você... Ah, me diga! Como poder te sentir se você se mostra tão longe, tão suficiente, tão real? Não.... não quero mais isso... e falta tão pouco!”

- Vai fazer o que hoje?

“Eu sabia! Por que ele não me fala de verdade? Por que insiste em parecer despreocupado. Ele se mostra tão vivo sem mim, tão íntimo... O que eu vou fazer hoje? Como se isso realmente lhe importasse! Mas eu respondo, vou ter que responder meu bem, senão você pensará que me esforço em parecer louca, e não há nada pior do que um sentimento forçado. Mas então o que estamos fazendo? Por acaso essa conversa não seguiria o mesmo rumo? Por um acaso eu queria que ele pudesse me ler inteira agora, saber exatamente o que estou pensando, para poder nos poupar dessa conversa desinteressada”

- Não sei.

“E você ainda insiste! Vá... se livre dessa presença, pelo menos depois você não precisa de conversas cansativas e estranhas. Mas não, eu preciso saber mais de você! Mas estou com raiva, e não quero te dizer porque você nunca me diz... Vá, diga que quer ir embora, que não me quer mais, porque eu ainda não arrumei coragem.”

- Eu te ligo pra marcarmos alguma coisa, tenho que ir agora.

“Eu sabia, você enjoou. Ou talvez esteja apenas cansado. Mas em qualquer um dos casos, por que não me diz? Seria tão mais suportável... seria... seria... seria suportavelmente triste. Mas eu não me atrevo a forçar o que não consigo ser para agradar-te, não consigo mentir pra mim mesma. E me sinto tão monótona. O que você quer? Eu te quero agora meu bem, sim, quero. Não só a parte e o pedaço, mas todo, e poder por alguns instantes te chamar de meu, como aquelas músicas que já nos são parte, e que esquecemos completamente que não foram feitas por nós; mas elas existem pra nos lembrar de momentos que serão eternos, e agora eu te quero ser eterna. Mas não sei o que fazer. Um gesto louco, que nem eu tenho coragem talvez, ou agir ‘normalmente’ como até agora fui somente através de máscaras. Vai, olhe pra mim, isso, não desvie o olhar... preciso que você saiba o que estou pensando, pelo menos uma parte mínima. Mas você foge, me olha sem olhar, me erra.”

- Tudo bem.

“Não adianta. Ela sente tanta coisa e não consegue me sentir agora. Em que estará pensando, será que desconfia que estou com raiva e que realmente desejo ir embora? Será que sabe que ao mesmo tempo que quero ir bastaria a palavra certa para ficar um pouco mais? Ah, eu não preciso mais disso! Te quero sim, mas não através de falas, nem através de sorrisos. É algo mais que isso, mas não chega a ser completamente importante. Talvez eu devesse parar de pensar em você, porque quanto mais eu faço menos eu te sinto. Vou indo então. Não queria, mas foi você quem escolheu. Talvez o desejo de você volte amanhã ou daqui algumas poucas horas, quem sabe! Mas agora adeus.”

- Então tchau.

( Curto silêncio. Pequeno e ligeiro beijo)

- Tchau.

(Ele se vira e dá de costas)

- Ei!

“Ela me chamou. Você me deu adeus, mas me chamou de volta. Será agora talvez você dirá o que eu queria ouvir? Será que eu não vou mais precisar de tanto silêncio, irritações e esperas quando estou com você? Vai...me diga... te esperarei por agora... mas não demore muito, o sono pode voltar.”

“É agora! Te direi, gritarei bem alto que mais do que te quero. Te adoro e desejo, mesmo que seja apenas nesses loucos segundos. Então você saberá que eu sou mais do que palavras fortes e feitas. Não sou de frases prontas e nem de sentimentos loucos. Te direi e então poderei me sentir normal e íntima a você, mesmo que você não me queira mais. Sim, o que importa é que te direi. E mais do que isso, irei querer vê-lo no dia seguinte, e no próximo, e no próximo, e no próximo... Até que os dias, as horas e nossos segundos acabem. Ou até que você olhe para mim sorrindo – e como eu amo seu sorriso tímido- e diga que enjoou, que não me quer mais. Mas diga, pois eu preciso te ouvir mais do que nunca.”

- Sim?

“Vai, diga qualquer coisa. Qualquer uma daquelas palavras bonitas que só você consegue. Estou aceitando frases prontas, palavras fortes e feitas... o que seja! Eu só quero algumas poucas palavras suas.”

- Me liga mesmo né?

“...”

- Ligo sim... Adeus!

- Adeus!

Ah se eles gritassem... não teriam mais medo, ele fugiria junto com os gritos.

Um comentário:

MeaCulpa disse...

deveras prazeiroso... muito bom
parabéns
=*